Cooperação
Caro RAF: no seguimento da tua digressão (e do teu repto), diria que a cooperação é muitas vezes observada no mundo humano e animal. Schelling já nos tinha falado sobre a importância das considerações estratégicas em determinados comportamentos habitualmente tidos como "éticos". Ou seja, o «self-interest» pode implicar altruísmo. Isto não é contraditório. A noção de interesse próprio é em última análise algo vazia, porque tautológica:
tudo o que fizermos só o fazemos porque está no nosso melhor interesse fazê-lo. Típico argumento de «preferência revelada». Interesse próprio e egoísmo são diferentes. Egoísmo implica que o teu interesse próprio apenas inclua o teu bem-estar individual.
Recordo as conhecidas palavras de Adam Smith, na abertura do seu «The Theory of Moral Sentiments»: «How selfish soever man may be supposed, there are evidently some principles in his nature, which interest him in the fortune of others, and render their hapiness necessary to him, though he derives nothing from it, except pleasure of seeing it». O tema da liberdade e da comunidade é muito interessante e complexo. A Inglaterra é um caso ímpar, onde existe um forte espírito de comunidade, mas que surge de forma espontânea e não por imposição exterior, como é o caso de retóricas marxistas. Nos EUA, esse espírito quanto a mim não existe porque o "sucesso" é o valor predominante. Enquanto em Inglaterra não há modos de vida predominantes. Há apenas liberdade - de cada um levar a cabo a sua vida como lhe aprouver. Em Portugal, é o que sabemos: modo de vida: encosto ao Estado.
Por falta de tempo, não me posso alongar demasiado aqui. Como tu, também gostaria de saber as opiniões do LA-C a partir dos EUA e do AAA aqui bem perto. Finalmente, deixo aqui umas propostas de leitura, sobre vários exemplos onde a cooperação acontece: porque é um prazer, porque é uma escolha óptima, porque ajuda à sobrevivência das espécies. É de notar que qualquer dos exemplos se pode englobar na motivação do último. Penso que é impossível hoje em dia procurar entender o comportamento humano sem atender à luz da teoria da evolução (que também referi aqui).
E também é crucial não cair na armadilha de achar que a aceitação das ideias de Darwin num contexto social implicam aceitar (e para alguns "propor") a "lei do mais forte". Isso nem sempre acontece, pelo menos da forma simplista que alguns invocam. Importa perceber que: 1) "ser (o) mais forte" nem sempre leva a comportamentos não cooperativos ou de confronto; e 2) por vezes o nível relevante de análise (em termos de decisão) não é o indivíduo mas o grupo em que ele se insere, em especial daqueles que partilham parte dos seus genes.
Eu sou daqueles que acham que o biólogo John Maynard Smith merecia mais do que ganhar um Nobel da Economia. Ou, para esse efeito, o Nobel de qualquer outra ciência social que fosse galardoável, tal foi o seu impacto na forma como vemos o mundo e as motivações do comportamento humano. A sua mais conhecida publicação, Evolution and the Theory of Games, é um livro que aconselho vivamente a ler. Imprescindível é também o clássico Selfish Gene de Richard Dawkins. Conto voltar a este tema e a actualizar as leituras recomendadas quando tiver mais tempo.
tudo o que fizermos só o fazemos porque está no nosso melhor interesse fazê-lo. Típico argumento de «preferência revelada». Interesse próprio e egoísmo são diferentes. Egoísmo implica que o teu interesse próprio apenas inclua o teu bem-estar individual.
Recordo as conhecidas palavras de Adam Smith, na abertura do seu «The Theory of Moral Sentiments»: «How selfish soever man may be supposed, there are evidently some principles in his nature, which interest him in the fortune of others, and render their hapiness necessary to him, though he derives nothing from it, except pleasure of seeing it». O tema da liberdade e da comunidade é muito interessante e complexo. A Inglaterra é um caso ímpar, onde existe um forte espírito de comunidade, mas que surge de forma espontânea e não por imposição exterior, como é o caso de retóricas marxistas. Nos EUA, esse espírito quanto a mim não existe porque o "sucesso" é o valor predominante. Enquanto em Inglaterra não há modos de vida predominantes. Há apenas liberdade - de cada um levar a cabo a sua vida como lhe aprouver. Em Portugal, é o que sabemos: modo de vida: encosto ao Estado.
Por falta de tempo, não me posso alongar demasiado aqui. Como tu, também gostaria de saber as opiniões do LA-C a partir dos EUA e do AAA aqui bem perto. Finalmente, deixo aqui umas propostas de leitura, sobre vários exemplos onde a cooperação acontece: porque é um prazer, porque é uma escolha óptima, porque ajuda à sobrevivência das espécies. É de notar que qualquer dos exemplos se pode englobar na motivação do último. Penso que é impossível hoje em dia procurar entender o comportamento humano sem atender à luz da teoria da evolução (que também referi aqui).
E também é crucial não cair na armadilha de achar que a aceitação das ideias de Darwin num contexto social implicam aceitar (e para alguns "propor") a "lei do mais forte". Isso nem sempre acontece, pelo menos da forma simplista que alguns invocam. Importa perceber que: 1) "ser (o) mais forte" nem sempre leva a comportamentos não cooperativos ou de confronto; e 2) por vezes o nível relevante de análise (em termos de decisão) não é o indivíduo mas o grupo em que ele se insere, em especial daqueles que partilham parte dos seus genes.
Eu sou daqueles que acham que o biólogo John Maynard Smith merecia mais do que ganhar um Nobel da Economia. Ou, para esse efeito, o Nobel de qualquer outra ciência social que fosse galardoável, tal foi o seu impacto na forma como vemos o mundo e as motivações do comportamento humano. A sua mais conhecida publicação, Evolution and the Theory of Games, é um livro que aconselho vivamente a ler. Imprescindível é também o clássico Selfish Gene de Richard Dawkins. Conto voltar a este tema e a actualizar as leituras recomendadas quando tiver mais tempo.
10 Comments:
Faltam aqui os "sunspots" como mecanismo de coordenação.
By Anónimo, at 1:57 da tarde
Acho que falta imensa coisa, meu caro LA-C, o intuito era mesmo so' um pontape' de saida... o tema e' interessante mas demasiado extenso. Depois quando tiveres tempo, tens que partilhar a tua opiniao sobre o "espirito de comunidade" ai nos States. Acho que essa e' uma diferenca crucial com Inglaterra, mas o meu conhecimento e' muito assimetrico.
By Tiago Mendes, at 2:04 da tarde
Neste fim de semana falarei nisso.
By Anónimo, at 2:07 da tarde
Na minha insuspeita condição de esquerdista radical anti-americano, refiro que as pessoas que eu conheço que passaram temporadas nos EUA dizem que lá os vizinhos ajudam-se mais uns aos outros (p.ex. a tomatrem conta dos filhos quando os pais saiem à noite) de que em Portugal.
By Anónimo, at 2:15 da tarde
Excelente post. Quero ver se escrevo qq coisa sobre o assunto mads nao tem dado. So tenho tido tempo para posts de copy/paste. :)
By André Azevedo Alves, at 2:42 da tarde
Miguel: creio que sim. Portugal e' um caso extremo por causa da inveja. O interesse na minha optica esta' mais na diferenciacao entre o caso ingles e americano, ja' que e' comum ler-se por ai que os casos sao muito "parecidos" devido 'a tradicao de liberdade. Ora que acho que sao ainda assim substancialmente diferentes. Nao na liberdade, mas nos tais "modos de vida", que sao "sugeridos" nos EUA e nao na Inglaterra. Isto simplificando, claro.
Andre e IDI: obrigado.
By Tiago Mendes, at 5:48 da tarde
Daniel Dennett tambem e uma boa referencia aqui
Ana
By Anónimo, at 2:42 da tarde
Ana: não conheço, confesso. Alguma referência/leitura em especial que recomende?
By Tiago Mendes, at 2:47 da tarde
Tiago: veja o "Darwin's dangerous idea" (o estilo e uma delicia).
Ana
By Anónimo, at 4:38 da tarde
Ja' esta' anotado, Ana, obrigado :)
By Tiago Mendes, at 4:40 da tarde
Enviar um comentário
<< Home