Ouvindo os silêncios
Sempre me impressionou o número de casais, em restaurantes e outros locais públicos, que passam horas sem falar um com o outro. Não creio que estejam a desfrutar do silêncio. Aliás, acho que escolhem locais bem ruidosos para terem a certeza de que o barulho dos outros os deixa, sim, desfrutar do silêncio do outro! (o que é algo bem diferente de desfrutar do silêncio). O que pretendem é libertar-se da "obrigação" de comunicar. Saem não para estar juntos mas para evitar terem de se suportar ou descobrir que não têm nada para conversar. Há muitos casais para quem as vidas sociais intensas são na realidade uma forma de escapar um do outro. Nestes casos, estar em silêncio é apenas um estratagema para evitarem ficar a saber que apenas teriam coisas inconvenientes a dizer. Estes casais não estão em silêncio. Estão é a procurar fugir do seu silêncio.
Seja como for, hoje não convivemos bem com o silêncio. Há sempre uma música de fundo onde quer que estejamos. Até nas igrejas, local onde o culto se associava tantas vezes ao silêncio, é hoje frequente entrarmos e ouvirmos em fundo música sacra, como se as pessoas temessem ficar a sós com Deus. Parecemos obcecados em preencher o silêncio como se o silêncio não contivesse vida e, desta forma, um momento de silêncio fosse um momento perdido. Quando nos falam de uma vida intensamente vivida nunca pensamos numa vida vivida em silêncio.
4 Comments:
"E o silêncio deve servir para pensar ou para sentir? É o silêncio o caminho para escutar o que pensamos ou será que, como diria o Caeiro de Fernando Pessoa, o silêncio deve ser antes utilizado para procurar sentir sem pensar pois pensar é não compreender um mundo que apenas foi feito para se sentir?"
Sem dúvida que o silêncio serve para escutar o que pensamos (e não o que achamos que pensamos, ou o que achamos que devíamos pensar). Sem artifícios, o silêncio ajuda-nos a chegar à nossa verdade verdadeira.
By Anónimo, at 11:03 da tarde
Totalmente de acuerdo, cara MJA, tx 4 d comment :)
By Tiago Mendes, at 11:12 da tarde
"(...) por vezes, o silêncio também nos engana. Quantas vezes não associamos o silêncio de alguém a uma personalidade observadora e inteligente ("saber estar calado") para depois descobrirmos que afinal o mistério não tinha nada de misterioso era apenas alguém sem nada de interessante para dizer."
Completamento verdadeiro!!!
Mas também não é preciso muito tempo e esforço para desmascarar estas pessoas. É ou não é? É o mistério em torno das posturas, visivelmente silenciosas, que nos fascina e deixa a pensar: qual será a sua opinião? Espanto o nosso quando descobrimos que se trata de uma pessoa insegura. Mas esperta por ter encontrado uma arma de presença social. E é uma boa arma, sim, sim, quando não se tem para falar ou não se deve falar...E por vezes (mais vezes do que menos vezes, em contextos siciais e profissionais, não se deve mesmo falar.
By Anónimo, at 11:24 da tarde
A ciência de interpretar os silêncios e as "posturas" e gestos tem muito que se lhe diga. Eu que sou quase leigo na matéria, vi um programa na BBC em que uma especialista em interpretar body language dava uma lição (mesmo) autêntica sobre as intenções por detrás do príncipe Carlos de Inglaterra, aquando do casamento recente, recuperando imagens do casamento com Diana, revendo e relendo tiques, etc. O poder de análise era tão impressionante que não tenho dúvidas em dizer que Carlos deve ter dormido muito mal nas noites seguintes... é que foi totalmente "despido", ou "desmascarado" se preferirem.
By Tiago Mendes, at 11:40 da tarde
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