aforismos e afins

05 outubro 2005

Dúvidas a "abortar"

Sampaio diz "Não tenho dúvidas, mas posso estar enganado", a propósito do pedido de parecer ao Tribunal Constitucional sobre o referendo ao aborto. Pergunta: não será isto uma impossibilidade lógica? Como pode alguém sugerir que a probabilidade (subjectiva) de estar enganado é estritamente positiva, e ao mesmo tempo ter dúvidas? Quando não se tem dúvidas, isso é o mesmo que achar que a probabilidade (subjectiva) de estar enganado é 0. Nem 0,2 nem 0,01. Senão, diria - ainda que a mensagem não fosse tão fluída em termos mediáticos - "praticamente não tenho dúvidas", ou, "tenho quase a certeza". No fundo, o presidente estava provavelmente a pensar na frase de Bento de Jesus Caraça:
"Se não receio o erro é porque estou sempre disposto a corrigi-lo." Só que - quiçá pela formação humanista mais dada a "floreados" do que a "lógica(s)" - acabou por cair num paradoxo. Que de resto repetiu inúmeras vezes, de forma algo irritada e por isso mesmo ridícula, dado o seu estatuto. É mais um pequeno "episódio" vindo de Belém, de dimensão dispicienda - é certo, mas ainda assim a relembrar a qualidade do discurso político que temos no PQT.

Eu, pessoalmente, nem me identifico com (a falta de lógica de) Sampaio, nem com o (tique de altivez do) que comummente se atribui ao desejado candidato presidencial. Porque tenho, é um facto, muitas dúvidas. Ainda que raramente me engane. A razão é simples: só falo quando acho que tenho alguma coisa a dizer.
Quando tenho dúvidas significativas, calo-me. E quando as não tenho, não serão muitos os que me conseguirão calar. No fundo, será uma espécie de "imperativo moral" de procurar (e comunicar) a "verdade", temperado com uns pozinhos de auto-estima, e sempre vigiado de muito perto pelo (infelizmente tão esquecido) ditado popular "Quem te manda a ti sapateiro tocar rabecão".

2 Comments:

  • Caro/a:

    "Toda a gente tem muitas certezas, mas pouco conseguem aguendar o fardo de as ter."

    E claro que e' "discurso politico", eu referi isso qdo disse que os constrangimentos "mediaticos" em termos de discurso a tanto obrigam. Nao havia era necessidade do homem fazer uma figura tao ridicula! A dizer que sim, que tem certezas, mas que pode estar enganado, e que enviou o pedido por uma questao meramente "formal". Nao acho muito respeitavel a "forma" como ele se dirigiu aos juizes do TC, como quem diz "va', digam la' qq coisa sobre este assunto, a ver se despachamos isto, embora eu me esteja marimbando para o que venham a dizer".

    Para quem teria a desculpa do "discurso politico" para incorrer num lapso de logica, acaba por tb se contradizer, pq a falta de diplomacia e' notavel neste episodio.

    Conclusao: o homem que ir de ferias!

    Diria mesmo (ele): "Deixem-me DESCANSAR!!!"

    Venha o outroooooo! ;)

    By Blogger Tiago Mendes, at 12:06 da tarde  

  • ...e obrigado pelo comment, diria que esta mesmo no ponto "optimo" de conseguir uma notavel riqueza argumentativa (e vocabular) sem que por isso se torne (demasiado)hermetico :)

    (os imbecis nao contam, claro, hehe)

    By Blogger Tiago Mendes, at 12:08 da tarde  

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