Rousseau e Sá-Carneiro
É o título de mais uma excelente crónica de João Carlos Espada no Expresso, disponível aqui. Acho até que ele foi muito brando com Rousseau. Umas breves citações do seu Contrato Social seriam bem elucidativas para certa esquerda ainda meio confusa nos dias que correm. Excelente também para reducionistas e platonistas. É impressão minha, ou JCE tem vindo a melhorar ultimamente, sobretudo no «tom» (mais calmo) com que aborda as questões?
5 Comments:
Eventualmente, meu caro Tiago Mendes, tu é que já estás mais amaciado para o ler;).
By RAF, at 12:30 da manhã
Nem tanto, meu caro... eu não sou nem nunca fui "apreciador nato" de JCE, embora lhe reconheça muitas qualidades, entre as quais (e com conhecimento de causa) ser um excelente professor e pedagogo. Mas várias vezes já o critiquei, sobretudo em tempos idos em que ele recorria com regularidade a argumentos falaciosos sobre Europa, jacobinismo, educação, moral sexual, costumes, etc.
Acho que ultimamente ele não tem sido nada demagogo, e é isso que eu sublinho com agrado. Acho que JCE está cada vez menos eivado dum certo desejo de barricada que lhe vi em tempos, em que a cereja em cima do bolo era aquele pedantismo com as descrições da "good old England", etc.
Enfim, eu se elogiei JCE é mesmo por não ser, de longe, um indefectível dos seus escritos, ainda que partilhe em grande parte o seu (*actual*) pensamento liberal e pluralista.
By Tiago Mendes, at 12:47 da manhã
Bem, JCE participou activamente no PREC, enquanto eu tinha acabado de aprender a falar, logo a opinião dele vale muito mais que a minha.
No entanto, pelo que eu sei do assunto, parece-me que ele está a fazer uma amálgama um bocado abusiva entre os "autoritários", que diziam que o povo "ainda" não estava preparado para a democracia (os "gonçalvistas") e os defensores "da participação directa e sem intermediação do povo" e das "forças armadas (...) destituídas de hierarquia" (os "otelistas").
É certo que, nos ultimos meses do PREC, essas duas facções jogaram em conjunto, mas, antes disso, não tinham sido raras as alianças entre os "otelistas" e os "moderados". E, se o [golpe esquerdista do 25/11 tivesse triunfado|golpe reaccionário do 25/11 tivesse falhado](riscar o que não interessa), talvez os "moderados" se tivessem passado para o lado "gonçalvista" (para eles, sempre seria melhor que o "anarco-populismo" otelista - pelo menos, continuava a haver hierarquia no exército). Ou seja, havia uma situação triangular e não bipolar.
Claro, pode-se argumentar que o "poder popular de base" conduz, por efeitos perversos, à ditadura, mas, mesmo que concordemos com isso, misturar as duas coisas é como equiparar um homicida involuntário e um assassino.
By Miguel Madeira, at 1:26 da manhã
Caro RAF,
Só para terminar, diria que tenho também gostado mais das crónicas recentes de JCE porque ele se tem focado na dimensão política do liberalismo. Quando ele fala de costumes e moral, fico em polvorosa. Quanto ele fala de economia (tipo "flat tax") com um simplismo grande e não demasiado autorizado, também fico de pé atrás. Acho que a escolha recente dos sub-temas (já que o "tema" é sempre, sempre, sempre, o mesmo) tem sido certeira, e a escrita não só escorreita, como o tom é positivo e não confrontacional.
By Tiago Mendes, at 10:49 da manhã
Aquilo que o JCE escreve é mais do que previsível: ataques constantes aos soviéticos (e ao Marx) e aos jacobinos (e ao Rousseau); elogios constantes ao capitalismo (e ao Adam Smith) e às posições conservadoras (e ao Burke). O seu discurso é repetitivo na forma e (quase) vazio no conteúdo, e não resiste a uma qualquer critica capaz de revelar as suas contradições. Descobertas estas é fácil perceber que a única coisa que ele pretende é fazer propaganda em favor dos americanos e ingleses.De facto, nem seria preciso ler toda a sua crónica para perceber isso: bastava ler o primeiro parágrafo e verificar que quem organizou a conferência foi a fundação americana «Liberty Fund».
Ele começa a sua crónica como o seu bla, bla, do costume quando quem está em causa é o Rousseau (e a revolução francesa): para ele a vontade geral é um totalitarismo que se opõe aos interesses particulares dos indivíduos, à sua liberdade e espontaneidade, assim como ao pluralismo e variedade. Segundo o JCE, quer dizer então que é impossível haver interesses comuns entre os vários indivíduos, e que é impossível a sua união, na medida em que tal seria sempre uma imposição*. Não se pode, assim, falar em interesse nacional, nem em interesses de classes profissionais, nem em interesses partidários, etc. Mas não. Ele não vai tão longe. Não tem coragem para tanto. A ele só lhe interessa atacar o Estado e defender o capitalismo. Qualquer outra organização (como os partidos), ainda que expresse uma vontade geral (ou pelo menos não particular), não é totalitária, nem monista, nem anti-pluralista. O próprio capitalismo não seria um todo, ou um sistema, que está acima das partes, mas seria o encontro e a soma de interesses destas partes.
Mas porque é que o JCE não vai tão longe, como uma critica ao unanimismo ou ao pensamento único exigiria? Não vai para não cair no relativismo. Mas a verdade é que já caiu, quando critica o platonismo e quando «defende» o modo de vida particular de cada individuo. É então o JCE um relativista e um pós-moderno envergonhado? Não. O que ele é, é um manipulador e impostor. Uma critica radical ao platonismo traduz-se numa critica à oposição entre o mundo da verdade e o mundo da aparência e às dicotomias que lhes estão associadas. Mas na propaganda do JCE essa dicotomia não é superada nem abandonada (e por isso mesmo o seu discurso não passa de propaganda encapotada). Ele não está para além do bem e do mal, pois para ele há um Bem e uma Verdade (que os Berlins, Poppers e Burkes lhe revelaram) e um Mal (que os Rousseaus e Marxs materializam). Assim, o que ele defende (sem aspas) não é o modo de vida particular de cada individuo. O que ele defende é um modo de vida que esteja subordinado aos valores de uma «vontade geral» conservadora e capitalista. Porque para ele o que é um individuo livre, espontâneo e plural? È aquele que é «decente», puritano, e que usa gravata, como um verdadeiro «gentleman».
No que diz respeito ao MFA, o que o JCE, de forma obcecada, continua a querer fazer é um ajuste de contas com o seu próprio passado maoísta, projectando no MFA aquilo que ele desejava no passado. Aliás, toda a sua crónica é um ajuste de contas com o seu passado.
* A propósito de imposições e da vontade geral rousseana de querer obrigar os indivíduos a serem livres, a impostura recente do JCE revela-se com seu apoio à invasão e «libertação» do Iraque. Mas para ele aqui a «democracia» não foi imposta nem os iraquianos foram obrigados a ser «livres».
By Anónimo, at 6:58 da tarde
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