aforismos e afins

30 setembro 2005

Trapalhadas trabalhistas

Recomendo a leitura deste post e dos links que lá aparecem. O comportamento muito pouco liberal de certos trabalhistas merece reflexão para lá da espuma dos dias.

28 setembro 2005

Presidenciais (11)

Alegre acabou, porém, por cair no erro em que todos os restantes candidatos de esquerda caíram: o de afirmar que o seu objectivo é derrotar Cavaco. É certo que se demarcou da afirmação de Soares segundo a qual Cavaco não teria perfil presidenciável, mas afinou pelo mesmo diapasão quando disse que o queria obrigar a uma segunda volta.

O histórico do PS pode, de facto, dificultar a vida a Cavaco Silva. Conseguindo votos que de outra forma iriam para a abstenção, ou seja mobilizando mais eleitores da esquerda, obriga o candidato do centro-direita a necessitar de mais votos para poder ganhar à primeira volta. (...)

Alegre terá, no entanto, de explanar outros objectivos que não os da mera derrota do candidato apoiado pelo PSD e pelo PP. Alegre deve tentar mobilizar o seu eleitorado em nome de valores e de ideias que rompam com a fantasia de que as presidenciais se disputam como um desafio ou um jogo entre a esquerda e a direita.

Comentarices

"Mas há um ponto onde eu não altero a minha leitura e, a de que esta eleição tem um alto grau de probabilidade de se decidir à primeira volta. Eu sei que os teóricos das sondagens dizem que os candidatos presidenciais, à primeira volta, só são eleitos se tiverem mais de metade dos votos validamente expressos. E os votos validamente expressos são os votos dos outros candidatos e os votos nulos. Não contam, para este apuramento, os votos brancos. E daí tiro o corolário de que quantos mais candidatos houver, mais votos validamente expressos há e, portanto, mais difícil será que um candidato perca." - disse Vitorino.

Espantoso "corolário", este. Valerá a pena comentar? Ilustres opinion-makers que se confundem com um conceito tão simples como o de "percentagem" fazem-me lembrar o texto de JPP, em que este diz: "as pessoas continuam a achar que cultura é saber o número de cantos dos Lusíadas mesmo que não se saiba o principio de Arquimedes, ou o que é a inércia".

E já dou de barato a sugestão quase insinuadora (ou seria uma mera "gaffe" num discurso oral mal preparado?) que sobressai no uso da expressão "o que os teóricos das sondagens dizem" para se referir a uma coisa perfeitamente objectiva que dá pelo nome de "regra eleitoral". Com tanta confusão, não é de excluir a hipótese duma auto-flagelação por "direito ao contraditório"... ao próprio.

Aphorism

The goal of political studies is not knowledge, but action. [Aristotle]

Presidenciais (10)

E resistir é tudo o que Mário Soares fará. Resistir e querer que o país o acompanhe no suicídio. Com Soares, ao fim de 5 anos tudo estará pior, confuso e mais pobre. O presidente fixe dos dois primeiros mandatos ficará na memória como um homem falhado.

Ouvindo os silêncios

Sempre me impressionou o número de casais, em restaurantes e outros locais públicos, que passam horas sem falar um com o outro. Não creio que estejam a desfrutar do silêncio. Aliás, acho que escolhem locais bem ruidosos para terem a certeza de que o barulho dos outros os deixa, sim, desfrutar do silêncio do outro! (o que é algo bem diferente de desfrutar do silêncio). O que pretendem é libertar-se da "obrigação" de comunicar. Saem não para estar juntos mas para evitar terem de se suportar ou descobrir que não têm nada para conversar. Há muitos casais para quem as vidas sociais intensas são na realidade uma forma de escapar um do outro. Nestes casos, estar em silêncio é apenas um estratagema para evitarem ficar a saber que apenas teriam coisas inconvenientes a dizer. Estes casais não estão em silêncio. Estão é a procurar fugir do seu silêncio.

Seja como for, hoje não convivemos bem com o silêncio. Há sempre uma música de fundo onde quer que estejamos. Até nas igrejas, local onde o culto se associava tantas vezes ao silêncio, é hoje frequente entrarmos e ouvirmos em fundo música sacra, como se as pessoas temessem ficar a sós com Deus. Parecemos obcecados em preencher o silêncio como se o silêncio não contivesse vida e, desta forma, um momento de silêncio fosse um momento perdido. Quando nos falam de uma vida intensamente vivida nunca pensamos numa vida vivida em silêncio.

27 setembro 2005

Presidenciais (9)

Alegre vai ficar com o discurso de esquerda para si, e com o radicalismo desse discurso, e vai deixar a Soares o discurso do centro. O discurso da gravidade e da autoridade. Isto, afinal, é o que Soares fez e muito bem toda a vida: meter o socialismo na gaveta. E ganhar eleições perdidas. Se não asneirar e não deixar que seja o PS a fazer e a marcar a sua campanha, Soares ganha. O PS, entretanto, pela boca de Josés Lellos e afins, já começou a asneirar. Este é o principal problema de Soares. Não é Alegre.

Presidenciais (8)

Na minha leitura mais-ou-menos trimestral do Abrupto, dei com esta excelente crónica que me tinha passado ao lado.

Presidenciais (7)

A questão, contudo, é saber que tipo de inquilino o país precisa em Belém nos tempos que correm - mesmo sabendo nós que o Presidente tem uma capacidade de intervenção muito limitada e que a governação reside em S. Bento. E por muitas voltas que se dêem, o que o país precisa neste momento é de exemplos em Belém, exemplos de trabalho, de rigor, de competência, de provas dadas nacional e internacionalmente, de reconhecimento pela obra feita, exemplos de que os tempos que correm exigem sacrifícios a todos os portugueses e não palavras de compreensão para lóbis que defendem os seus interesses que são incompatíveis com o interesse geral da sociedade.

Antecedentes (moderadamente) criminais:

Presidenciais (6)
Presidenciais (5)
Presidenciais (4)
Presidenciais (3)
Presidenciais (2)
Presidenciais (1)

Leitura recomendada

Reconstruir tudo, ou dar cheques equivalentes?

26 setembro 2005

Erotismo e Sexualidade (2)

Em sequência do meu anterior post, ouvi dizer que não havia nele uma única menção a "emoções"; e que a diferença entre sexualidade e erotismo seriam sobretudo os omitidos "sentimentos". Quando escrevi o texto não me passaram pela cabeça essas palavras (ou conceitos), confesso. A razão de tal omissão parece-me a posteriori bastante evidente: vem duma postura profundamente liberal em relação à vida: se duas pessoas se envolvem - de livre vontade - em actividades de cariz erótico, é porque têm um mínimo de entendimento comum sobre isso.

Nesse chão que ambos aceitam pisar podem florir inúmeros sentimentos - o erotismo é terra fértil por excelência. E se nele se podem esconder inúmeros alçapões, mais não podemos fazer que recomendar aos mais fracos de constituição que se acautelem, caminhando pé-ante-pé e medindo bem cada passo.

Metáforas à parte, a mim basta-me saber que a escolha das duas pessoas é livre para saber que isso revela que ambas preferiram optar por aquilo que escolheram. E o erotismo é um mundo tão gigantesco que prefiro deixar o adjectivo à imaginação de cada um, concentrando-me no verbo e na sua harmoniosa conjugação. É que, lembremo-nos, sempre tudo começa aí.

Estado Civil

O novo blog de Pedro Mexia.

25 setembro 2005

Pássaro ferido

Começou por dizer que a sua candidatura era um «acto poético». Tradução simultânea: não tenho obviamente quaisquer condições para vencer Cavaco - não quero tal - e candidato-me exactamente porque sendo um perdedor natural a minha candidatura poderá ser um poema em acção. Estão a ver, uma coisa tipo as candidaturas do PCP (ou CDU, mais verdes menos verdes, vai tudo dar ao mesmo) mas com uma rima de métrica superior. A verdade crua (sobretudo para ele) é que o homem simplesmente não se imaginava como presidente. Depois, é traído pelo velho «amigo» Soares, e fica combalido; faz o papel de vítima, e desiste da candidatura. Quando já não aguenta a dor, pergunta-se: pensando melhor... o que é que eu tenho a menos que os outros candidatos? E, depois de reunidos alguns apoios financeiros, atira-se para a frente num vôo esplêndido e anuncia a ressurreição do seu projecto poético.

Cavaco vai rindo (só pode). A esquerda vai gangrenando. Os portugueses, esses, surpreendem-se ao ver que mesmo depois do fenómeno Santana Lopes ainda é possível alguém - de livre e espontânea vontade - cobrir-se de ridículo. Por falta de falta de leitura política mas sobretudo por agir com base em emoções e ressentimentos. Manuel Alegre candidata-se não para se vingar de Soares mas para salvar a sua honra. Não percebe que ela já estava perdida quando se emaranhou em declarações contraditórias com a sua ideia inicial do «acto poético». A única "racionalidade" na sua candidatura é que na esquerda portuguesa o prevalecente sentimento de "pena do coitadinho" trará votos a Alegre - a pobre vítima traída pelo maldoso Soares.

Manuel Alegre encarna uma categoria especial da política portuguesa - a dos políticos "mortos-vivos", em que se destaca o Manuel do "Diga lá ao". O anúncio da candidatura mistura algo de "Mr. Bean" e "The Night of the Living Dead". E o país, com tanta emoção e loopings estratégicos, assemelha-se perigosamente a um arenal de «buggeiros» brasileiros.

Com tanta emoção, podemos dispensar um qualquer «Príncipe», mas precisamos desesperadamente dum trago de Maquiavel.

23 setembro 2005

Carrilho não, obrigado

Os perigos do racionalismo na política; a arrogância a deslizar para o totalitarismo; e os demais tiques do sr. filósofo - tudo isso muito bem apanhado neste artigo de Martim Avillez Figueiredo.

22 setembro 2005

Erotismo e Sexualidade

Este belíssimo texto do meu caro jmnk tem desde há tempos a haver um comentário meu, que não chegou antes apenas por achar que alguma frieza e racionalidade da minha parte podem ser desapropriadas como resposta a um texto cuja poesia é evidente. Mas, enfim, vamos a ele. Primeiro por partes, e depois o todo:

1. "Não há uma diferença essencial entre erotismo e sexualidade; o erotismo é sexualidade socializada. A sua complexidade - rituais, cerimónias - começa por ter uma função social; o que distingue um acto sexual de um acto erótico é que no primeiro, a Natureza serve a espécie, enquanto no segundo, a sociedade humana é servida pela Natureza."

Concordo apenas com uma coisa aqui: que a "sexualidade" - que é simplesmente um acto físico em si - é uma coisa "natural" e cuja origem está na propagação da espécie. Isso é, de resto, comum a todos os animais (sexuados). O que distingue então o erotismo? Aqui é que a questão é mais complexa. Porque temos que olhar para a "causa" e perceber aquilo que está (positivamente) correlacionado com essa causa - que chamaríamos de "causa primordial" - mas que tem apenas com ela uma "relação espúria" - e não causal. Se o erotismo só existe no contexto humano, é bem provável que a diferença entre erotismo e sexualidade seja simplesmente a diferença (primordial) entre o homem e o animal.

Essa diferença - quanto a mim - chama-se "consciência"; e não "inteligência" ou "racionalidade". Estas últimas são condições necessárias mas não suficientes para a primeira, que como tal é mais restritiva - mais exacta. [Não vou alongar-me aqui, mas poderíamos voltar ao tema da inteligência artificial e falar da formas de "inteligência inconsciente"]. Por isso, eu discordo quando dizes que "não há uma diferença essencial" e que essa diferença está no facto de o erotismo ser "sexualidade socializada". Aqui, como em tantas outras coisas, sou muito individualista: não acho que o sexo sirva a sociedade. A sexualidade é sempre uma experiência individual, passível de ser uma experiência "erótica" se tiver outros ingredientes. Quando se torna uma experiência "social" (claro que não falo de "bacanais" e afins, mas sim da dimensão social da sexualidade, a que tu te referes, penso eu) isso é, de qualquer modo, acessório - uma consequênia de segundo grau, se quiseres.

De resto, quando dizes que os rituais começam por ter uma dimensão social, eu pergunto-te: se dois adolescentes vivessem sozinhos numa ilha deserta, seria possível eles viverem uma experiência erótica ou apenas sexual? Em que sentido falarias aqui do "ritual" mais ou menos socializado da sexualidade? Eu percebo que hajam certas aprendizagens que se fazem e que não nascem connosco. Mas eu quero crer que mesmo um homem des-socializado seria capaz de ter alguma carga erótica na sua vivência sexual. Isto se fosse mesmo "homem" e não animal - e não tenho como seguro que um homem que nasça e viva numa ilha deserta se diferencie do animal, mas isso é outra questão, de resto muito interessante e muito complexa.

Mas isto leva-nos à questão da diferença do erotismo. Quanto a mim, erotismo é simplesmente sexualidade consciente. Consciente do que se faz, do que se sente, consciente do outro, dele próprio; até consciente que se poderá estar - durante o acto em si - inconsciente. Esta consciência proporciona miutas coisas, como a "arte" de fazer amor, a criatividade ao serviço dos amantes, até a racionalização da relação amorosa-sexual. Ou, se formos mais longe - a sua "sacralização". Mas, volto a dizer, tudo isto são consequências não necessárias do facto de haver consciência; são oportunidades, não consequências imediatas.

Um exemplo que não estará fora de moda (sobretudo para "desperate housewives" e afins) é o sexo "puro e duro" (ou "sexo à bruta"): repara que mesmo neste caso, apesar de o acto em si ser uma mímica do mundo selvagem, em que sentido é que não é "erotismo"? Só porque (aparentemente) não há carinho nem diálogo nem altruísmos pelo parceiro que nunca mais se vem? Em que sentido é que a cena mítica no filme "Emmanuelle", quando a rapariga é oferecida como troféu ao campeão de Thai Boxing, como "mero" pedaço de carne, não é erótica? Só porque o sexo ali é puramente animal? "Emmanuelle" é o grande filme erótico por natureza - porque é nele que uma menina desperta conscientemente para a riqueza e complexidade da sexualidade, pela mão do seu "amante-tutor".

Dito isto, numa coisa eu tenho que concordar contigo: na medida em que o homem é um ser social - e a sexualidade tem muito de aprendizagem - também ela será reflexo dessa socialização - eu acho é que exageras na causalidade e na enfatisação no factor socializante. A sexualidade é animalidade, ponto final. O erotismo é sexualidade consciente. Embora também seja verdade que no acto sexual haja um esbatimento da consciência - afinal o que busca o homem no acto amoroso senão um certo alívio existencial, um voo sem destino través do outro?

2. "Um dos fins do erotismo é domar o sexo e inseri-lo na sociedade. Sem sexo não há sociedade pois não há procriação; mas o sexo também ameaça a sociedade. É instinto: tremor pânico, explosão vital. É um vulcão que ameaça cobrir a sociedade com uma erupção de sangue e sémen. O sexo é subversivo: ignora as classes e hierarquias, as artes e as ciências, o dia e a noite. O erotismo, com seu conjunto de proibições - mágicas, morais, legais, económicas e outras - defende a sociedade dos assaltos da sexualidade, mas também nega a função reprodutiva. É caprichoso servidor de vida e morte."

O erotismo não tem fim, quanto a mim. "Beber sem sede e fazer amor constantemente, minha senhora, apenas isso nos diferencia dos animais" [Beaumarchais]. O homem não só tem capacidade de escolha como isso significa que muitas das aparentes "finalidades" de certos acto são conclusões exageradas. Concordo que o sexo ameaça a sociedade - e a tua descrição é perfeita e bela. Mas discordo que o erotismo defenda a sociedade dos assaltos da sexualidade - antes pelo contrário, e em concordância com o que acabaras de dizer - até ajuda a isso. Porquê? Porque o homem gosta de transgredir. No fundo, o homem impõe regras sociais também para as não cumprir e se sentir até mais ou menos priviligiado por o poder fazer. Aliás, como uma das manifestações do erotismo é a "pura e dura" animalidade (ou sexualidade), por definição não a pode proteger. A função reprodutiva não é negada; é apenas "posta de parte". O que faz todo o sentido, já que para os homens - como diz a frase acima citada - o sexo não é para procriação, mas sim "quando o homem quiser". (E felizmente mais vezes que o Natal). Que é caprichoso, é: porque é viciante. Por isso o homem tem que se precaver contra abusos.

3. "Mas o erotismo é algo mais. É sexualidade transfigurada: metáfora. O agente que move tanto o acto erótico como o poético é a imaginação. É a potência que transfigura o sexo em cerimónia e rito, a linguagem em ritmo e metáfora. A imagem poética é um abraço de realidades opostas e a rima, uma cópula de sons; a poesia erotiza a linguagem e o mundo porque ela mesma, no seu modo de operar, é já erotismo. E do mesmo modo: o erotismo é uma metáfora da sexualidade."

O erotismo pode ser tudo: metáfora, hipérbole, anáfora - a figura de estilo que queiras - da sexualidade. Exactamente por ter o ingrediente da imaginação. Mas é, concordo, sobretudo uma metáfora, por ser uma transposição da sexualidade animal para o contexto mais rico dos humanos, onde a linguagem - a grande diferença que se segue à consciência - tem um papel fulcral. Os sons, as danças, os sorrisos - tudo o que referes.

De resto, todo o texto, mas em especial este último parágrafo, são de uma beleza avassaladora. E é por isso que me sinto honestamente confrangido por escrever coisa tão desinteressante e ainda por cima tão extensa. Espero não ter sido demasiado literal e não ter desvirtuado o sentido do teu texto. Um abraço,

“Noites à Direita”

A não perder HOJE às 20h30, no Jardim de Inverno do Teatro Municipal de S. Luiz, em LISBOA, o segundo encontro desta iniciativa, sob o tema "A Direita e a Cultura". Com os ilustres
Pedro Mexia, Rui Ramos, António Mega Ferreira como "agente provocador" e moderação de Manuel Falcão.

21 setembro 2005

Incongruências bem visíveis

Denominar-se de "liberal", "não homofóbico", e ao mesmo tempo dizer que na luta pelos seus ideais dará "Playboys gratuitas para mostrar a racionalidade de gostar mais de mulheres" é do melhor. Reparem bem na palavra usada: r-a-c-i-o-n-a-l-i-d-a-d-e. Desta ideia à eugenia e aos mais variados totalitarismos vai um passo muito curto, como todos sabemos. O que fazer quando nos foge a boca para a verdade, caro Pedro Picoito?

19 setembro 2005

Casmurrices

A não perder: um, dois, três, e quatro.

Humanidades

Isto podia ter sido dedicado a ti.

Desista, Dr. Soares

Uma carta oportunamente publicada aqui.

Leitura recomendada

"De facto, o valor gerado numa economia é função de dois factores: a qualidade dos seus recursos (capital físico, recursos humanos, recursos naturais); e a eficiência com que estes recursos são empregues.

É indiscutível que a economia portuguesa precisa de melhores recursos físicos e humanos. Precisamos de elevar o nível tecnológico; melhorar a educação básica e secundária; formar melhores gestores. Mas seria um erro pensar que a solução está na qualidade dos recursos. A solução está principalmente na melhoria do emprego dos recursos que temos
."

A parede

A vida é um longo, e talvez interminável, período escolar, com diversas matérias e inúmeros mestres, e aprendemos tudo, e contudo não aprendemos nada. Cometemos sempre os mesmos erros, como se estivéssemos programados para eles. Voltamos aos mesmos lugares, inventamos as mesmas situações, desejamos as mesmas coisas - e no entanto gostaríamos que existisse outra coisa, outro campo de possibilidades, outra alegria mais simples. Mas somos cegos para ela, como os outros são cegos para a nossa.

Podemos imaginar, como tantas vezes o fiz, que existem situações de transparência e envolvimento de um dentro do outro em nós cada vez mais apertados. E existem, eu sei que existem. Eu vivi esse modo de existir. Mas, ao mesmo tempo, sempre tive a ilusão de que pelo facto de existirem, e de serem de tal modo intensos e siderantes, eles pertenciam à eternidade. O meu erro estava em pensar que era possível que eles durassem sempre, porque só assim existiam verdadeiramente, e eu estava a sentir que existiam verdadeiramente.

Não julgo que ninguém de bom senso acredite que na vida política, ou mesmo na vida profissional, se possa imaginar um ideal de transparência. Quando fui fazer a minha experiência diplomática em Paris, alguém me disse: "olhe que a diplomacia é concreta, discreta e secreta". E Julian Freund afirmava que "a sinceridade não é uma virtude pública". Tudo se iria desmoronar se os homens políticos fossem inteiramente sinceros - tal como se desmoronava também se eles fossem inteiramente falsos. Mas no plano privado, pode-se pensar que a sinceridade absoluta é uma virtude. Mas tal como podemos defender que a democracia é um valor superior ao da verdade (tese de Richard Rorty), talvez se deva dizer que a felicidade é superior à sinceridade: como Nietzsche explicou, cada um de nós é feito de verdade e ilusão, e a arte é essa forma luminosa de ilusão que nos permite resistir à verdade.

A transparência implica o desarme - mas raramente dois desarmam ao mesmo tempo. E seria um erro pensar que o facto de um se desarmar perante o outro faria que esse outro desarmasse também. Por vezes a situação de vulnerabilidade acicata no outro o desejo de vencer. E assim temos a grande linha de tragédia entre os homens: os estados de iminente transparência transformam-se num jogo de massacre, numa batalha campal. As metáforas guerreiras são aqui imprescindíveis. E nenhum apelo que se faça tem escuta do lado oposto. Era preciso que houvesse um só lado e dois corpos entregues à nudez do desconhecido. Lacan tinha um curioso jogo de palavras: transformava "l"amour" em "le mur". O que nos sufoca é este sentimento de que, como num conto de Edgar Poe, estamos definitivamente emparedados.

O meu erro, aquele de que farei a minha verdade até à morte, é o de que em determinadas circunstâncias é possível atingir o outro e tocar-lhe naquilo que ele tem de mais íntimo, secreto e criança. Por vezes apetece-nos pegar em alguém pela garganta da angústia e absorver-lhe a própria respiração. Existirá uma palavra mágica? Só que o outro não está onde julgamos que ele está. Ou está, e nós fomos condenados a não o ver?

A beleza poderá ser o que não tem a ver com a aparência, mas, sim, o que numa pessoa vem sinalizar a sua capacidade de se deixar olhar e mergulhar em transparência. Isto na paixão, claro, mas também na amizade. Porque a diferença entre a paixão desmedida, a medida do amor quotidiano, feito de gestos tão pequenos que por vezes são invisíveis, e o nó denso da amizade, vai-se esbatendo com o tempo - e isso nós conseguimos aprender. Em dada altura temos todos a mesma idade - se quisermos. A dada altura o amor rodeia-nos por todos os lados. Estendo o braço e espero, na ausência da tua mão, as mãos numerosas e quentes que suportam a queda.

Artigo de Eduardo Prado Coelho, publicado no PÚBLICO de hoje.

14 setembro 2005

Racismo(s)

«Quando se culpa apenas a Administração Bush de tudo, e os brancos de tudo, de todo o racismo, deixa-se de lado o racismo de negros contra negros, o fosso entre ricos e pobres da mesma cor. Existe, e são poucos os que o saltam. Na América, como em África, quem menos ajuda os negros são os negros

13 setembro 2005

Poupança e Incentivos

Comentário ao artigo de Martim Avillez Figueiredo, no DE:

1. Dizer que "poupar é melhor que gastar" não diz muito e parece cair no erro típico de esquecer que em tudo na economia (para não dizer na vida) há custos e benefícios, que precisam de ser medidos e confrontados. A poupança é necessária? Sim. Mas há uma "taxa óptima" de poupança, tal como há uma taxa óptima de investimento, ou de endividamento, quer das famílias quer das empresas. Não há "bons" e "maus" aqui. Por exemplo, o endividamento das famílias para comprar casas é "bom" na medida em que sinaliza que elas puderam aceder aos seus rendimentos futuros (via empréstimo) num mercado liberalizado (pensem em comprar casa em Cuba). Mas também pode ser "mau" se for excessivo e comportar um risco excessivo quer para o indivíduo, quer para o banco, quer para o sector financeiro. O “óptimo” aqui não é “inimigo do bom” mas sim "o ponto onde o “bom” e o “mau” se encontram e ficam empatados";

2. O endividamento externo não é necessariamente mau e isto constitui outra falácia dentro do mesmo género, apenas parcialmente desculpável por alguma "simplicidade" requerida no jornalismo. Um país que esteja a crescer a uma taxa mais alta que aquela a que consegue pedir emprestado, deve endividar-se, tal como sucede para uma empresa, com a diferença (imporatnte) que tem a ver com questões de dependência política e geoestratégia. Mas, de um ponto de vista estritamente financeiro, se a rentabilidade é maior que a taxa de juro paga, deve-se investir. E deve-se investir exactamente até ao ponto em que a taxa de retorno é igual à taxa de juro. O ponto crucial é que há um “custo de oportunidade” que tem de ser tido em conta: dinheiro que não é investido num projecto com rentabilidade de X% custa “de facto” X%. Logo, se conseguirmos obtê-lo a Y% < X%, façamo-lo para lucrar a diferença;

3. A taxa de poupança por si só não explica muito (tal como "nada" por si só explica muito na teoria do crescimento económico). Na China uma taxa de poupança alta pode ser parte da “receita” de sucesso (ou, talvez melhor, das “condições de arranque”) mas temos o exemplo dos EUA, que sendo o país mais rico do mundo tem um dos maiores endividamentos ao exterior (justificáveis pelo dólar, certo, mas ainda assim constituindo um contra-exemplo). O ponto é novamente não simplificar em demasia: a poupança não é nenhuma panaceia e devemos evitar a “manobra estatística” de seleccionar de uma pool de casos de sucesso de crescimento económico aqueles que têm taxas de poupança estridentes, apenas para (tentar) fazer o ponto;

4. A questão da "legitimidade" dos benefícios fiscais é mal posta, quanto a mim. A legitimidade tem a ver com os compromissos eleitorais. A questão base que se põe aqui tem três vectores: i) eficácia - ter os resultados pretendidos; eficiência - ter resultados (quaisquer que sejam) da forma mais barata possível; e iii) justiça/equidade - a medida ter resultados que são "desejáveis". O ideal será conjugar os três. A justiça/equidade pertence à esfera normativa e é natural um governo eleito democraticamente poder fazer as suas escolhas. Da eficácia e eficiência fala-se a seguir;

5. Tornar os benefícios “universais” é eliminar os benefícios e apenas subsidiar a poupança em geral. É natural, como refere o estudo do INE, que sejam os contribuintes com maiores rendimentos a beneficiar mais destes produtos. Porquê? Simplesmente porque não têm restrições de liquidez e podem afectar parte das suas poupanças e preencher os tectos máximos de deductibilidade. Será isto mau? Não. A falácia aqui é dupla: por um lado, porque os contribuintes com menores rendimentos poderão também mudar os seus comportamentos, ainda que em menor grau; por outro, mesmo que apenas os mais ricos o façam, isso em si é - ainda que não enormemente - positivo. É aqui que está o busílis da questão. Pensemos no exemplo dos PPR’s.

Um consumidor tem três escolhas grandes a fazer: consumo (C ), poupança “normal” (PN), e PPR’s que o Estado subsidia via benefício fiscal (PPR). Imaginemos que o indivíduo tem rendimento 100. Inicialmente gasta 85 em C, 15 em PN e 0 em PPR. Quando o Estado passa a subsidiar PPR’s, ele poderá continuar com C = 85 e afectar 5 de poupança aos PPR’s, ficando com PN = 10 e PPR = 5. É isto mau? Não. Porquê? Porque os PPR’s têm regras específicas e constituem de facto uma forma de poupança diferente da PN. O intuito principal por detrás do incentivo aos PPR’s é "incentivar" (uma espécia de “convidar” convincente) o contribuinte a pensar no futuro, ganhar responsabilidade, consciencializar-se das escolhas que tem de fazer na sua vida como um todo, e diminuir a dependência face ao Estado “paternalista” que ele julga que sempre estará lá para tomar conta dele. [Veja-se (o tom d)a nossa "bendita" Constituição].

O sistema actual de Segurança Social está a caminho da banacarrota. Medina Carreira e tantos outros já o disseram dezenas de vezes. O caminho tem que passar por – com maior ou menor progressividade – complementar o sistema público com um sistema privado de gestão e pensões de reforma. O dinheiro investido em PPR’s não tem a mesma liquidez que um depósito a prazo ou um fundo de investimento. Só pode ser acedido antes da reforma em circunstâncias muito especiais. Não pode ser utilizado para comprar carro, casa, ou ir de férias. Por esta razão, mesmo que apenas haja uma reafectação dos níveis de poupança inicial, isso em si já é bom.

E isto é, como diz MAF no final, o pagamento de um “prémio” por uma poupança já existente. Mas é pagar um prémio para “converter” essa poupança já existente numa poupança que tem certas regras e que ajuda a diminuir a dependência face ao Estado. No limite – e em termos puramente teóricos – uma subida na taxa de poupança (via benefício fiscal) pode levar a que o consumo aumente e a poupança global diminua (a poupança com benefícios não pode diminuir). Isto acontece se o “efeito rendimento” for superior ao “efeito substituição” no agregado. O efeito substituição faz o consumo baixar porque está relativamente mais “caro” face à poupança, que é relativamente mais atractiva com os benefícios fiscais. O efeito rendimento faz o consumo subir (se for um “bem normal”) porque os benefícios fiscais fazem aumentar o rendimento real do agregado. Se este aumento for suficientemente grande, o consumo pode aumentar, apesar de o incentivo na margem ser para uma diminuição nele.

A mudança de atitudes dos portugueses, nomeadamente a caminho de uma maior "autonomização", passa por certo tipo de políticas. Menos Estado, mas também um Estado certo, que onde existe emite sinais que apontem para caminhos virtuosos e que promovam o "bem comum". E a consciencialização de que parte da reforma de cada um deve ser descontada de forma directa é uma etapa urgente. É que todos sabemos que quando uma certa aversão à eficiência reina supostamente em defesa de uma certa equidade, o sistema colapsa e todos ficam iguais, mas na miséria.

PS: Como refere LP nos comentários ao artigo citado, seria urgente inserir no programa lectivo uma formação minima em finanças, para que o jovem saiba minimamente pensar sobre onde e como investir o dinheiro. Mas no sistema de ensino há muita coisa que devia ser inserida, e isso não cabe aqui.

Férias (3)


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07 setembro 2005

Rescaldo

Este blog não encerra mas entra em «hibernação profunda».
Não encerra porque às vezes a vontade de escrever é incontrolável e mais vale «nunca dizer nunca». Mas tem que hibernar porque a vida de blogger é demasiado absorvente. Assim, e aproveitando o que de bom trouxe a mudança de template, não há links nem site meter. E, a aparecerem outros posts, serão apenas sobre assuntos públicos, ficando os intimismos para outros lados (if anything) para não misturar as coisas. Sease the day.

01 setembro 2005

«About»... what?

Mudam-se os tempos, mudam-se os templates. E a barra de links e afins minimaliza-se com aviso prévio ignorado. «Uôp-se».

Out of Tune

O silêncio hibernativo-meditativo do A&A sabe muito bem. Pausas com suspensões arbitrárias são música para os meus ouvidos.